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O ensino remoto emergencial e o ensino de língua portuguesa

Atualizado: 18 de abr. de 2023

A experiência do PIBID no CEU EMEF Casa Blanca


Em 16 de março de 2020, a suspensão das aulas foi decretada no Estado de São Paulo (decreto 64.684) e, em 18 de março, a Secretaria Estadual de Educação de São Paulo homologou a deliberação aprovada pelo Conselho Estadual, permitindo que as atividades escolares fossem realizadas por meio de EAD (ensino a distância) a alunos do ensino fundamental e médio, no período de suspensão das aulas, para serem computadas como dias letivos. Nesse contexto, os professores e os estudantes buscaram contornar as adversidades para alcançar uma experiência de aprendizagem.


Nessa trágica situação, nós nos defrontamos com a exigência de repensar a docência na escola, uma vez que uma nova prática completamente desconhecida se deu no contexto digital. A partir dessa repentina mudança, é importante considerar a perda de algumas características constitutivas da experiência escolar, como a presença física na sala de aula, o diálogo face a face com o professor, enfim um momento em que o aluno experimenta as sensações da aprendizagem, o convívio com os pares, etc. A leitura, por exemplo, é uma das atividades que sofre grande perda na modalidade remota. Segundo Zumthor (1990, p. 81-82),

A performance na leitura muda a estrutura do sentido. A primeira não pode ser reduzida ao status de objeto semiótico: alguma coisa dela sempre transborda, recusa-se a funcionar como signo... e, no entanto, exige interpretação: elementos marginais em relação à linguagem e raramente codificados (o gesto, a entonação), ou situacionais com respeito à enunciação (tempo, lugar, cenário).

Há de se concordar com o autor suíço sobre a importância do trabalho com a voz e o corpo para uma aprendizagem significativa da língua. As circunstâncias então vigentes, calcadas no ensino remoto, impediram, no entanto, essa vivência concreta, reduzindo a interação social às telas de computadores, tablets e celulares. Na melhor das hipóteses, os estudantes que contavam com alguma estrutura física, emocional, familiar e material transformaram suas casas em salas de aula virtuais.

Tal realidade trouxe ainda novas problemáticas para o ensino público (em especial, as escolas periféricas), como o restrito acesso à internet pelos estudantes e professores, uma vez que as aulas remotas ocorriam pela plataforma Google Meet. Além disso, outras dificuldades surgiram, como o déficit educacional dos alunos, sinalizando a profunda precarização da educação pública.

O objetivo deste texto é discutir a experiência de licenciandos e de supervisores na condução das atividades desenvolvidas cotidianamente durante o ensino emergencial remoto, abrangendo tanto os desafios quanto as oportunidades educacionais que emergiram em tal contexto. Para fazer isso, dividimos o capítulo em duas partes. Na primeira, após uma contextualização sobre o funcionamento do ensino remoto na escola, apresentamos cinco relatos de três licenciandas do curso de Letras da USP sobre a atuação em parceria com os três docentes responsáveis pela disciplina de língua portuguesa das doze turmas do Ensino Fundamental - Anos Finais (6º ao 9º ano) do CEU (Centro Educacional Unificado) EMEF Casa Blanca, escola pertencente à Diretoria Regional de Ensino (DRE) Campo Limpo, Zona Sul da cidade de São Paulo. Na segunda, a professora supervisora do CEU, Aline Magna de Aguiar Vieira, relata sua relação com os licenciandos envolvidos. Ao final, tecemos nossas considerações finais sobre o processo de acompanhamento das aulas e seu impacto em nossa formação como docentes.

Como as aulas remotas síncronas foram realizadas?


As aulas remotas apresentaram mudanças sensíveis em relação às metodologias tradicionalmente adotadas na modalidade presencial, o que abrange a produção de atividades didáticas, a seleção de materiais adequados ao formato das aulas e a escolha de temas profícuos para o contexto pandêmico. A dinâmica das aulas de língua portuguesa durante o isolamento social aconteceu em três eixos: reuniões de planejamento com estudos de fundamentação teórica, preparação de atividades e encontros semanais síncronos pela plataforma Google Meet. No CEU, havia três turmas de cada um dos anos do Ensino Fundamental - Anos Finais; no entanto, as aulas semanais remotas reuniam não mais do que 40 alunos.


A partir de novembro de 2021, no entanto, foram retomadas paulatinamente as aulas presenciais em esquema de rodízio. Isso acabou gerando um descompasso, na medida em que parte dos alunos matriculados acompanhava as aulas presencialmente, parte frequentava apenas virtualmente e outra parte não frequentava o ensino presencial nem acessava o ensino remoto emergencial, o que exigiu da escola a realização de buscas ativas para entender o que estava ocorrendo com nada núcleo familiar.


Em termos da dinâmica didático-pedagógica, destacamos que, no início do ano, a Secretaria Municipal de Educação encaminhou uma diretriz intitulada “Priorização Curricular” com o propósito de orientar os conteúdos disciplinares do ano letivo de 2021 em face dos desafios impostos pelo contexto pandêmico. Essa proposta seguia as orientações da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) com foco no texto como unidade de ensino de língua portuguesa:


Tal proposta assume a centralidade do texto como unidade de trabalho e as perspectivas enunciativo-discursivas na abordagem, de forma a sempre relacionar os textos a seus contextos de produção e o desenvolvimento de habilidades ao uso significativo da linguagem em atividades de leitura, escuta e produção de textos em várias mídias e semioses. (BRASIL, 2018, p. 67).

O documento norteador "Priorização Curricular" e o apostilado produzido no contexto pandêmico (Trilhas de Aprendizagem) enfatizam, a partir de uma perspectiva linguística, os gêneros textuais e suas características estilísticas mais ou menos estáveis. Embora tal abordagem de ensino da língua materna se volte a textos em diferentes campos da vida social, é perceptível um profundo distanciamento no que se refere ao campo artístico-literário, diminuindo o direito à literatura e, sobretudo, da escrita como produção de subjetividades. Belintane (2011, p. 117), professor da Faculdade de Educação da USP, afirma:


Essa indiferença e permissividade, com certeza, não advém diretamente da obra de Bakhtin, de Bourdieu, de Pêcheux ou mesmo dos autores brasileiros que partiram dessas correntes. Lembram mais uma deriva sem controle dos termos que se foram somando e se sedimentando no “uso da língua” e dos “gêneros” que matriciam o ensino de Língua Portuguesa e da Alfabetização (termos como “função social da escrita”, “diversidade de gêneros”, “universo do letramento” e outros) e que se opuseram à tradicional ideia de textos ou gêneros alienantes (distantes da realidade do aluno pobre, que favorecem mais a elite dominante) ou da escolarização do texto (o tal texto-pretexto).

Concordando com Belintane, é imprescindível que o professor de língua portuguesa esteja atento a não reproduzir os valores que pautam a educação como mercadoria ou como mera instrumentalização para o mercado de trabalho, como já discutia Freire (1996; 2020[1968]). O desejo de formar um ser humano precisa ser atravessado pela valorização do próprio ser humano. No período pandêmico, os desafios para manter o ensino de língua portuguesa foram vários e decorrentes de diferentes instâncias: seja a interação aluno-professor, aluno-aluno, aluno-licenciando, seja a situação socioeconômica.


É importante destacar que a maioria dos alunos acessava os encontros de ensino através de tablets distribuídos pela prefeitura de São Paulo. Os alunos presentes nas aulas síncronas mantinham as câmaras fechadas e os microfones desligados, de modo que a interação só ocorria por meio do chat, reduzindo as trocas conversacionais, levantamento de dúvidas e discussões de conteúdo. Em alguns momentos apenas, os estudantes ligavam o microfone para fazer perguntas aos bolsistas e professores. Notamos, contudo, que a participação dos alunos aumentava quando temáticas que ecoavam com seus interesses eram abordadas, como ética, ciência, mercado de trabalho, etc.


Além das aulas síncronas, o diálogo com os professores supervisores foi muito valioso, com grande abertura para partilhar as dificuldades do trabalho na escola pública. Uma conversa, em especial, com o professor André Calaresi permitiu-nos aproximar do árduo trabalho docente. Ele nos contou sua rotina: "mantenho uma dupla carga de trabalho nas duas redes públicas: municipal e estadual de ensino". Segundo ele, um dos fatores determinantes para uma boa experiência de trabalho escolar é o engajamento da gestão com a comunidade. Além disso, ele acrescenta que, no que tange ao ensino de língua portuguesa, é sempre muito desafiador escolher textos adequados ao perfil dos alunos da nossa comunidade. O professor relata, por exemplo, que trabalhou numa escola no bairro do Brooklin, onde nas proximidades há a comunidade chamada “Favela do Canão”, em que viveu o cantor, rapper, compositor e ator brasileiro Sabotage (Mauro Mateus dos Santos; 1973- 2003). Naquela situação, ele decidiu apresentar uma atividade em torno das canções do artista e obteve algum sucesso. Alguns alunos, no entanto, não aderiram à proposta por não se identificarem com o estilo musical rap, sobretudo aqueles com maior poder aquisitivo, que não queriam se ver associados à cultura da periferia, à cultura popular..


Roda de conversa sobre identidade


A professora supervisora Aline Magna de Aguiar Vieira propôs uma roda de conversa com os 8° anos sobre identidade afro-brasileira. Duas das bolsistas do programa foram convidadas a falar sobre como as tranças e os black powers as ajudaram a construir sua autoestima e a reafirmar sua identidade afro-brasileira. Nessa aula, um dos alunos escreveu no chat algo como “não me levem mal, mas essa aula está parecendo uma thread do Twitter”. Perguntamos, então, se ele não achava importante que estivéssemos tendo aquela conversa no contexto escolar, já que dessa forma poderíamos nos aprofundar no tema, diferentemente de quando a pauta surge nas redes sociais. Nossa proposta era propiciar momentos, sobretudo aos brancos e brancas, para refletirem sobre o tema e tentarem desconstruir sua subjetividade etnocêntrica, compreendendo que nem sempre estarão no centro dos debates, procedimento que se coaduna a uma perspectiva crítica de letramento (MATTOS; VALÉRIO, 2018).


O universo de interesse dos alunos


Conforme expusemos anteriormente, a substituição da sala de aula convencional pelos encontros na plataforma Google Meet trouxe prejuízos para a interação entre professores e estudantes. De maneira geral, as câmeras e microfones permaneciam desligados, e o chat predominava como ferramenta de comunicação nas aulas. Uma ilustração interessante deste acontecimento ocorreu via chat a partir da perspectiva de uma das alunas: a aluna escreve algo como “prefiro escrever no chat ao invés de falar, assim treino meu português.”


Observamos nessas aulas um aumento das interações conversacionais, ainda que com a limitação do suporte on-line, nos momentos em que os professores trouxeram atividades com temas direcionados aos interesses dos alunos. Como exemplo, há uma atividade preparada pelo professor supervisor André para introduzir o gênero resenha. Considerando o envolvimento que tinha com seus alunos e a relação interpessoal que desenvolveram ao longo dos anos letivos anteriores, o professor utilizou uma resenha sobre o videogame Minecraft. Esse foi um momento valioso de aprendizagem para os licenciandos, uma vez que percebemos que o interesse em comum mobiliza diálogo e enriquece as discussões em sala de aula.


Me formei, e agora?


Durante nossa experiência acompanhando as aulas remotas síncronas, notamos que os alunos do nono ano, apesar de ainda muito novos, demonstravam grande interesse e preocupação com o futuro e a inserção no mercado de trabalho.


A professora Aline organizou, então, uma dinâmica na qual os licenciandos responderam questões sobre como foi o processo de entrada na universidade e como o mercado de trabalho se configura para quem não possui ensino superior.


Como a turma estava prestes a concluir o ensino fundamental, a professora salientou a possibilidade de cursar o ensino médio de forma concomitante ao técnico em alguma ETEC (Escola Técnica Estadual). A possibilidade de aliar uma educação de qualidade a uma formação profissional específica despertou o interesse dos alunos.


Várias perguntas foram feitas em relação ao processo seletivo, sobre como era realizado o Vestibulinho e em qual ETEC ficavam cursos relacionados à arte e tecnologia, apenas para citar alguns exemplos. Todo esse interesse evidencia a busca por melhores condições e por mudanças na realidade socioeconômica.


Olhos d’água, olhos das nossas mães


A professora Aline Magna de Aguiar Vieira desenvolveu uma proposta didática para trabalhar a obra “Olhos d'água'' (2016) da escritora Conceição Evaristo, que envolveu, em uma de suas etapas, uma discussão acerca das impressões causadas pela leitura do conto.


Em sequência, a professora apresentou o vídeo O ponto de partida da escrita – Ocupação Conceição Evaristo'', no qual a escritora fala sobre seu processo de escrita e sua relação com a mãe. Já que o conto é sobre maternagem, termo usado por Evaristo, surgiu um debate sobre as identificações com as mães dos alunos da turma.



Durante a aula, os alunos mantiveram as câmeras fechadas e poucos utilizavam o microfone. A maior parte da interação era realizada pelo chat. Observamos que os alunos demonstravam dificuldade de se concentrar; qualquer coisa era motivo de dispersão. Temos de admitir que, no virtual, são muitos os estímulos visuais e sonoros. Em certo momento, o assunto do chat era totalmente diferente do tema proposto pela professora.


Ao fazer um paralelo com as aulas presenciais, chegamos à conclusão que essas conversas no decorrer das aulas sempre existiram. A diferença na situação on-line é que os diálogos paralelos podem ser acompanhados, o que dificulta o raciocínio da turma e mesmo dos professores. A solução adotada pela professora só foi possível em um cenário totalmente digital - ela desativou a função chat.


Acompanhar essa aula foi fundamental para pensar nos desafios que podem surgir durante as aulas. Mesmo com toda uma proposta didática criada, é possível que aconteça imprevistos ou mesmo que os alunos não se sintam envolvidos pela discussão. Em casos como esses, é importante o professor estar minimamente preparado para lidar com a situação.

As atividades assíncronas

Não podemos deixar de falar da condução das aulas e das atividades desse momento sem mencionar uma parte essencial delas, já que durante esse período, as aulas síncronas foram complementadas com outras atividades que aconteciam em outro ambiente virtual: o Google Sala de Aula. Em um primeiro momento, foi essa plataforma que de certa forma substituiu as atividades presenciais, já que através dela os professores podiam compartilhar tarefas e lições, monitorar a entrega e também manter o controle da realização e do aproveitamento de cada aluno. Posteriormente, ela serviu de apoio aos encontros síncronos para aqueles alunos que podiam participar das duas formas de atividades e se manteve como o único contato do aluno com a escola para aqueles que não tinham a chance de participar do ao vivo.

Além disso, os professores do CEU Casa Blanca a utilizavam como forma de registrar a presença e a participação desses alunos nas atividades sem a obrigatoriedade da presença síncrona dos mesmos, na medida em que, por essa plataforma, os alunos podiam realizar e entregar as tarefas no melhor momento para ele e para sua família. Tal estratégia foi adotada pela escola, uma vez que parte dos alunos compartilhavam os eletrônicos utilizados para o acesso com outros membros da família, ou ainda não tinham conexão de internet em suas residências e, portanto, deviam se deslocar para outro local a fim de realizar tais atividades.

Assim, o Google Sala de Aula foi parte essencial desse trabalho remoto, pois de fato, para muitos alunos, se tornou o único veículo de comunicação e contato com o conteúdo, o professor e a escola. Além dela, outro recurso foi o uso de grupos de Whatsapp para comunicação com os familiares e alunos que tinham o acesso à internet ainda mais restrito, visto que tal plataforma é gratuita para muitos planos de telefonia móvel.


Nós, bolsistas do PIBID, tivemos mais facilidade de acesso ao Google Sala de Aula do CEU Casa Blanca e fizemos parte principalmente da correção e do direcionamento de atividades, mas também da elaboração de tarefas das mais diversas, que eram publicadas após o aval dos professores das turmas. Ambas eram de extrema importância para a continuidade do trabalho do professor, muitas vezes sobrecarregado pela demanda de serviço e que, por isso, se apoiava em nós para conseguir atender a todos os alunos de forma personalizada.


Interação alunos-licenciandos, uma relação delicada: relato da supervisora do CEU Casa Blanca


A experiência de atuar na função de professora supervisora no PIBID- subprojeto de língua portuguesa revelou-se, em proporções equitativas, gratificante e desafiadora.

O primeiro adjetivo se dá em razão das parcerias, das trocas, e da execução de atividades feitas em coletivo. A presença dos estagiários nas aulas, planejamentos e avaliações pedagógicas proporcionou maior dinâmica, interação e novas reflexões ao trabalho, sobretudo, se evidenciarmos o contexto de exceção decorrente da pandemia de COVID-19 e a necessidade de se adequar emergencialmente ao ensino remoto.


Os estagiários acompanharam toda a complexidade e a construção desse trabalho experiencial, que fora repleto de erros e acertos; e, por isso, rico em reflexões e debates sobre o ensino da Língua Portuguesa permeado pelos recursos e (evidentemente) entraves tecnológicos. A atribuição do segundo adjetivo decorre do fato de que o projeto nos incita a nos retirar - do que podemos nomear - de zona de conforto docente, isto é, de nossos hábitos, muitas vezes engessados, na prática do processo de ensino-aprendizagem. Os estagiários nos convidam a refletir com maior clareza sobre a execução do trabalho feito, questionando e sugerindo outras metodologias, recursos e práticas.


Por outro lado, a experiência do professor supervisor também pode ser contributiva ao docente em formação, pois ele ou ela pode orientá-los na aplicabilidade do trabalho, seja em termos de planejamento, metodologias, avaliações, seja na interação direta com os alunos.


Cabe ressaltar que esse último fator revelou ser de caráter extremamente delicado e de importante atenção ao professor supervisor enquanto mediador da interação entre licenciandos e alunos, pois essa relação - principalmente na modalidade remota - poderia ser prejudicada, caso os estudantes não fossem totalmente receptivos ou não compreendessem a atuação dos professores estagiários (nomenclatura essa adotada pelos alunos) nas aulas síncronas, efetuadas no Google Meet ou mesmo na interatividade nas salas de aulas virtuais, no Google Classroom.


Tendo isso em vista, a apresentação dos licenciandos aos alunos foi discutida e planejada para que os estudantes pudessem compreender a presença, a função e a atuação dos graduandos nas aulas. Para tal, foram produzidos vídeos de apresentação, nos quais os licenciandos explicavam suas inspirações para a profissão escolhida, falavam de seus estudos, gostos pessoais, hobbies e descreviam as razões de estarem no PIBID e o que pretendiam fazer durante o projeto. Ainda, nas primeiras aulas síncronas das turmas, os licenciandos puderam reforçar essa apresentação. A ideia desse contato inicial, nesse formato, era também de criar um vínculo por meio da identificação dos estudantes com os estagiários.


Posteriormente a essas primeiras interações, o diálogo entre estagiários e alunos era sempre incentivado, tanto nas aulas síncronas quanto assíncronas. Esse fator possibilitou uma dinamicidade extremamente positiva: os alunos tiravam dúvidas e queriam ouvir a opinião dos licenciandos sobre os temas discutidos em aula; os estagiários teciam observações nas aulas, efetuavam perguntas aos alunos, realizavam comentários em algumas correções, postavam materiais e indicações de leituras, vídeos e sites para complementar os conteúdos de aula. Os estudantes, por sua vez, respondiam com comentários nas postagens. Durante as aulas no Google Meet, o chat era um recurso relevante para essa interação - os estagiários acompanhavam, dialogavam e lançavam apontamentos sobre o que os alunos escreviam.


No entanto, em certos momentos, essa relação passou por algumas dificuldades: em determinadas situações, os alunos não reconheciam a autoridade dos bolsistas, quando estes lhes chamavam a atenção por comportamento inadequado no chat, por exemplo. Em outros momentos, alguns alunos projetavam uma relação de proximidade com os licenciandos, tratando-os como se fossem amigos. Tais contextos exigiam uma intervenção e uma postura mais firme do professor supervisor para que as relações de respeito e cordialidade fossem mantidas.


Em suma, a mediação entre licenciandos e alunos é um trabalho significativo e exige um planejamento prévio para que se tenha sucesso e se possa garantir o bom funcionamento e todo o projeto.


Considerações finais


A educação viveu uma crise sem precedentes em 2020 e 2021, marcada por incertezas, adversidades e angústias. Já antes do contexto que nos obrigou a fazer do lar um espaço público, que nos obrigou a convidar dezenas de pessoas a “entrar” em nosso espaço particular, em nossas casas e, muitas vezes, em nossos espaços de descanso, ainda que através das telas dos dispositivos, havia um consistente e persistente questionamento: quais os rumos da educação brasileira?


A participação no PIBID é extremamente relevante para a formação de professores para a educação básica. Se, por um lado, o bolsista é sujeito passivo do aprendizado, por outro, é compelido a ser sujeito ativo quando é colocado diante dos desafios de sua futura profissão. É esta relação ambivalente que permite que erros e equívocos do aprendiz sejam bem assistidos e contornados, que constituam naturalmente seu amadurecimento enquanto, consequentemente, amadurecem também os supervisores/orientadores e o público-alvo: os estudantes da escola.


Sabemos que, no que tange ao ensino de língua materna, a educação formal deixa a desejar já há algumas décadas. A Língua Portuguesa falada no Brasil já é indicativo de uma nação situada na periferia do capitalismo, consolidada através da violência contra povos nativos. Somos falantes de português por ordem colonizadora. Ainda assim, temos muito a celebrar nessa língua. Sentimos em português, cantamos em português, declamamos em português. Descobrimos nosso universo material e subjetivo através de um feixe de vozes que falam e escrevem em português. Um dos desafios com o qual o professor de Língua Portuguesa se defronta é transformar a leitura e escrita em direito à expressão, corroborando assim para o desenvolvimento pleno dos estudantes como indivíduos e como cidadãos.


Embora a experiência com o ensino remoto emergencial nos remeta imediatamente às limitações, também é importante considerar que as tecnologias digitais efetivamente se instalaram no interior das práticas pedagógicas, colocando os educadores diante de novos desafios. Nesse sentido, consideramos que houve, em nossa empreitada como licenciados, um certo vanguardismo em relação às novas possibilidades que o universo digital revela à educação. A experiência chacoalhou aquilo que todos tradicionalmente pensávamos sobre prática e formação docente.


Autoras:







Referências


BELINTANE, Claudemir. A oralidade faz escrita(s) na(s) infância(s). Pesquisas e Reflexões sobre a relação oralidade-escrita nos anos iniciais de escolarização. São Paulo, 2011.


BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018.Disponível em http://basenacionalcomum.mec.gov.br/ Acesso em 17 mai. 2022.


FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.


FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2020 [1968].

MATTOS, Andréa Machado de Almeida; VALÉRIO, Kátia Modesto. Letramento crítico e ensino comunicativo: lacunas e interseções. Revista Brasileira de Linguística Aplicada, v. 10, n. 1, p. 135-158, 2010. DOI https://doi.org/10.1590/S1984-63982010000100008.


ZUMTHOR, Paul. O engajamento do corpo. In: ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção e leitura. Trad. Jerusa Pires Ferreira e Suely Fenerich. São Paulo: CosacNaify, 2007.



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